quinta-feira, 29 de outubro de 2009

DROGAS >> AMIGO DE VERDADE NÃO TE COLOCA NESSA FURADA


Resgatada pela mãe, a dona de casa L., 43 anos, na Favela do Jacarezinho, na Zona Norte do Rio, depois de mais uma temporada longe de casa, T. conta que já perdeu a conta de quantas vezes fugiu para se drogar. “Só sei que foram muitas. No início fugia só para ir a bailes funk. Depois que conheci o crack, comecei a passar dias, semanas e até meses sem voltar pra casa. Só vinha embora quando minha mãe subia o morro para me buscar”.

Há três anos, em 2006, T. foi tema de uma reportagem de O DIA também sobre dependência química. Na época, no entanto, seu problema era a maconha. A mãe tentava uma vaga para que a filha se internasse para tratamento na rede pública. Ela chegou a ficar reclusa duas vezes, mas por períodos de 25 dias apenas. O vício, desde então, só piorou, e o contato com o crack levou a menina a mergulhar ainda mais fundo nas drogas.

Filha de uma família de classe média, ela conta que dinheiro nunca foi o problema para comprar as pedras. “Quando não conseguia pegar na carteira da minha mãe, saía com os traficantes da boca”, revela. “Mas nunca aceitei pagamento em droga. Exigia o dinheiro para que eu pudesse pagar com a minha própria grana”, detalha a menina que desde que voltou para casa, há 18 dias, está sem usar a droga.“Hoje estou limpa, mas ainda sinto o cheiro e o gosto do crack na boca. E isso me deixa louca. Quando percebo que vou perder o controle, chamo a minha mãe e falo: ‘Mãe, estou surtando, quero ser algemada’, e ela sai correndo para pegar as algemas e me prender junto à cama”, detalha T. “Mas tem que esconder às chaves, porque, na fissura, se eu encontro, fujo na hora”, frisa a jovem, que também já frequentou o Complexo de Manguinhos. “Foi lá que comecei a me prostituir. No início, como era do ‘asfalto’, os traficantes me davam até R$ 30 pelo programa. Para as outras meninas só davam R$ 20. Depois de uns tempos começaram a me esculachar muito, por isso fui embora para o Jacarezinho, onde sabia que tinha um prostíbulo. Mas lá o preço é tabelado: R$ 15 pra todas”, diz T., que afirma já ter fumado até 30 pedras de crack num dia.“Não conseguia parar. Era uma atrás da outra. Se não fosse assim, a ‘deprê’ batia forte, e eu deixava de me sentir a mulher mais poderosa do mundo para me achar a pior de todas”, descreve a menina, que pede ajuda para se livrar do vício. “Se fico na rua, acabo me drogando. Preciso de um tratamento onde eu seja obrigada a me tratar. Ou o crack vai me matar”, desabafa T.





Ministro da Saúde reconhece falhas





O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, afirmou ontem, no Rio, que estão sendo investidos R$ 110 milhões em atendimento a usuários de crack em todo o Brasil e admitiu que há falhas no auxílio a dependentes químicos que precisam de tratamento. “Reconhecemos que existem falhas. Nem todas as pessoas que precisam conseguem atendimento no tempo que gostariam. Mas este plano que está sendo implementado vai trazer resultados”, afirmou. Os recursos são parte do Plano Emergencial de Ampliação do Acesso ao Tratamento e Prevenção em Álcool e outras Drogas, lançado em junho. O valor total previsto chega a R$ 117,3 milhões, dos quais R$ 41 milhões já foram repassados a estados e municípios.

Segundo o ministro, o número de leitos será ampliado em 2.500 em hospitais gerais do País, com capacidade para atender até 12 mil dependentes químicos. “Esse é um problema gravíssimo que afeta a sociedade brasileira. É um problema complexo porque nós estamos lidando também com tráfico e criminalidade”, completou Temporão.



Vício já ceifa oito em cada 10 menores


Levantamento da Secretaria Municipal de Assistência Social com menores de rua confirma a devastação do crack nesta década. Oito em cada 10 jovens são viciados; há quatro anos, eram 13%. A prefeitura ainda descobriu que muitos mentem o nome e de onde vêm para sustentar a dependência. No Flamengo — onde O DIA terça-feira encontrou jovens entorpecidos amontoados —, a maioria vem da Zona Oeste e Baixada.“Tentam confundir o entrevistador e querem se manter longe da família. Mas descobrimos de onde vêm”, explicou o secretário Fernando William. “A agressividade deles, incomum há alguns anos, é mais uma herança maldita”. Quatro clínicas de desintoxicação e internação serão abertas mês que vem.

Segundo o subchefe operacional da Polícia Civil, delegado Carlos Oliveira, a maior parte do crack que chega ao Rio vem de São Paulo. Ele afirma que as favelas do Jacarezinho e de Manguinhos foram as primeiras a vendê-lo, mas que hoje todas as quadrilhas o comercializam. “Este combate não pode ser exclusivo da polícia, precisa ser um trabalho engajado da sociedade”, afirmou.



´´A DROGA TOMOU CONTA DA MINHA FILHA``



Desesperada com o sofrimento da filha, a dona-de-casa L., 43 anos, conta que já não sabe mais o que fazer para tentar salvar a vida de T. “Essa droga tomou conta da minha filha de tal maneira que hoje eu chego a ter medo dela”, admite L. “Mesmo assim não vou desistir. Isso nunca”, garante a dona-de-casa.

Desempregada, L. conta que teve que pedir demissão do emprego para vigiar a filha. “Ela precisa ter alguém tomando conta dela 24 horas por dia, senão ela foge de novo. Enquanto não bate a fissura ela fica bem. Mas, quando isso acontece, se não tiver quem a prenda, ela vai embora mesmo”, conta a mãe, que, além das algemas, também já usou correntes para manter a filha dentro de casa.

Inconformada com a falta de clínicas de tratamento públicas, para cuidar de viciados em drogas, L. alerta: “Se o Poder Público continuar dando as costas para esse problema, ele só vai piorar. E não adianta dizer que a responsabilidade é da família, porque sozinhos não vamos conseguir salvar nossos filhos. Digo isso por mim, e por milhares de mães que hoje sofrem deste mesmo problema”, critica L. que, em 2007, chegou a tentar suicídio após ver a filha fugir pela terceira vez

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